Os reguladores da economia da transição, parte 1

Introdução à segunda seção do volume 2 de O marxismo e a transição socialista.

Há dois meses – março de 2025 – publicamos uma apresentação do que será nosso volume 2 de O marxismo e a transição socialista. Planejamento, mercado e democracia operária, dedicado, como se pode ver, à economia da transição: “O debate sobre a economia planificada” (publicado na Izquierda Web). Nesta segunda entrega, buscamos divulgar o que virá a ser a primeira parte – em rascunho – da Introdução à segunda seção do nosso segundo volume. A primeira seção será dedicada ao estudo de nossos clássicos sobre a economia de transição. A segunda abordará os reguladores da economia transitória: o planejamento, o mercado e a democracia socialista. A terceira seção será dedicada à distinção entre a chamada “acumulação primitiva” de capitais, a acumulação socialista propriamente dita e a acumulação burocrática (aquela que se constituiu na URSS a partir dos anos 1930). Esta última incluirá uma análise crítica do movimento stajanovista, do sistema de trabalhos forçados (Gulag) e um retorno à coletivização forçada, já parcialmente tratada no nosso volume I. Finalmente, a quarta seção será dedicada aos problemas do planejamento neste século: questões como o planejamento algorítmico, a inteligência artificial e outras temáticas vinculadas à economia planificada no século XXI, o debate com as escolas liberais sobre o planejamento econômico, assim como a relação entre uma economia planificada e o meio ambiente.

Os reguladores da economia da transição, parte 1

Planejamento, mercado e democracia operária (rascunho)

ROBERTO SÁENZ

Edição deste texto: Patricia López

“Estudei com enorme dedicação a primeira parte da Crítica da Economia Política publicada em Berlim (…) Você expressa pela primeira vez de forma clara, irrefutável, científica, aquilo que daqui em diante constituirá a tendência consciente da evolução: submeter à consciência humana o processo da produção social que, até agora, não era mais do que um poder cego da natureza. Sua contribuição transcendental é a de ter dado inteligência a essa tendência, de ter demonstrado que à nossa produção faltava cabeça.”
Carta de Joseph Dietzgen a Marx, 5/11/1867, Karl Marx, “Cartas a Kugelmann”

1 – Os limites empíricos da Plataforma da Oposição Unificada (1927)

Os capítulos desta segunda seção da nossa obra serão compostos por esta “introdução geral” acerca dos reguladores econômicos e políticos da economia da transição e, posteriormente, apresentaremos capítulos específicos dedicados à operacionalização das categorias da economia política na transição: os alcances e limites da lei do valor nesse período; as potencialidades do planejamento socialista e sua diferença substancial com o planejamento burocrático; bem como a problemática da democracia socialista como relação de produção na economia transitória.

No geral, nossa abordagem irá colidir frontalmente com o senso comum do materialismo histórico aplicado a este tema ao longo do último século. Ocorre que o materialismo histórico vem sendo compreendido de maneira abstrata, a-histórica, não apenas nesta temática, mas em muitas outras relacionadas à transição socialista. Há uma vasta produção historiográfica sobre a experiência das sociedades pós-capitalistas do século XX, particularmente no que diz respeito à URSS, mas foi muito menos utilizada a inteligência teórica para contribuir nesse sentido: as categorias do marxismo foram aplicadas de forma acrítica, sem serem contextualizadas, o que levou a uma abordagem abstrata e mecânica da experiência (perdeu-se de vista a hibridação das categorias na transição, a superposição — até certo ponto — entre economia e política nesse processo).

Um exemplo disso é a perda do lugar específico e essencial da democracia socialista como mecanismo da economia de transição. A própria Plataforma da Oposição Unificada de 1927 para o XV Congresso do Partido Comunista (dezembro daquele ano, congresso decisivo no qual a Oposição de Esquerda foi expulsa do partido e foi lançado o Primeiro Plano Quinquenal) é um exemplo disso. Trata-se de uma plataforma extremamente valiosa, mas com o grave déficit de ser, em grande medida, economicista, na qual os problemas da burocratização do partido e do Estado soviético estão ausentes — um problema que ficou evidente rapidamente, quando Stalin fez uma guinada à ultraesquerda e se apropriou do que parecia ser esse programa de industrialização. Nesse sentido, a antiga Plataforma dos 46, de outubro de 1923, havia sido, de fato, mais equilibrada: abordava tanto os problemas econômicos quanto os democráticos. Rakovsky tinha razão quando, meses depois (durante o primeiro semestre de 1928), ao ter que enfrentar a guinada stalinista, afirmava que a fraqueza da Plataforma estava em seu caráter “empírico”, por não ter “cravado a faca” com profundidade suficiente nos males que afetavam a URSS. Não é casual que, nesse momento, ele tenha escrito simultaneamente um dos textos mais profundos sobre o fenômeno da burocratização, que até hoje costuma ser pouco estudado pelos marxistas revolucionários: sua brilhante Carta a Valentinov, também conhecida como Os problemas profissionais do poder, texto que abordamos em nosso volume 1 e retomaremos aqui: “Em 1923, antes da formação da Oposição de Esquerda, Rakovsky havia atacado abertamente as tendências burocratizantes e centralizadoras do novo Estado Soviético no XII Congresso do partido. A burocracia, disse naquele momento, era o principal perigo para o poder soviético e o fator que colocava em risco a revolução internacional [absoluta razão de Rakovsky, tratado habitualmente como um cachorro morto no movimento trotskista!]” (Gus Fagan, Biographical Introduction to Christian Rakovsky, 1980).[1]

Fagan acrescenta o que já apontamos acima: que a plataforma da Oposição Unificada no XV Congresso foi insuficiente por seu caráter empírico; trata-se de uma plataforma quase estritamente econômica e, para piorar, equivocada em certo sentido, pois meses depois Stalin daria uma guinada, supostamente, às mesmas políticas que a Oposição propunha — embora, detalhe nada menor, não com o objetivo de melhorar as condições das massas populares da URSS, mas às suas custas. Na sequência, é interessante notar que as Contra-Teses da Oposição sobre o Plano Quinquenal de Economia Nacional foram publicadas poucas semanas antes do início do XV Congresso, no qual a Oposição de Esquerda foi expulsa do partido e o zinovievismo-kamenevismo capitulou em pleno congresso. E que o valiosíssimo texto de Rakovsky, Carta a Valentinov, é datado de 6 de agosto de 1928.

As poucas partes políticas das Contra-Teses referiam-se à total ausência de democracia e à burocratização do partido na preparação para o XV Congresso (“o método puramente burocrático de preparação do Congresso”, seu caráter “não educativo”), à crítica aos efeitos deletérios sobre as massas do alcoolismo promovido pela burocracia, assim como à seleção negativa — os piores em vez dos melhores — para os diversos cargos da administração.

Isso não significa que a plataforma, mesmo em seu empirismo, não trouxesse observações agudas. Em primeiro lugar, a exigência de industrialização sempre vinha acompanhada da exigência de elevação do nível de vida das massas — o oposto do giro stalinista dos anos 1930, que promoveu a industrialização às custas da população. Além de reivindicar salários, emprego e moradia para as massas, a plataforma propunha um critério para a construção do socialismo que, nas décadas posteriores, se perdeu dentro do movimento trotskista, impactado pelas cifras do crescimento da URSS: “A produção socialista não tem como objetivo o lucro, mas sim a satisfação das necessidades. Este é o critério histórico fundamental pelo qual o sucesso deve ser medido (…) A plataforma da Oposição parte da convicção de que uma construção socialista bem-sucedida exige que a classe trabalhadora sinta, de forma real, mês a mês e ano a ano, um crescimento em sua situação material e cultural, e que participe de forma sistematicamente crescente em todas as esferas do trabalho construtivo e criativo. Por essa razão, a Oposição protestou contra toda tentativa de racionalizar [a economia] por meio de pressões sobre os trabalhadores.”

A Plataforma denuncia que a produção era realizada com base nos “músculos e nervos dos operários” — exatamente o oposto da conhecida afirmação de Nahuel Moreno de que na URSS existiria supostamente uma “democracia dos nervos e dos músculos” (uma história de ficção científica cuja origem é desconhecida!). Quanto ao alcoolismo promovido cinicamente pela burocracia, também são feitas observações agudas e socialistas (socialistas no sentido autoemancipatório: ninguém vai se autoemancipar sob os efeitos destrutivos da embriaguez): “A venda estatal de bebidas alcoólicas representa, para o sistema soviético (…) o aumento do tempo perdido, trabalho negligente, produção de mercadorias de qualidade inferior, danos à maquinaria, maior número de acidentes, incêndios, preguiça, etc.” Ou seja, em duas linhas resume-se, através do alcoolismo promovido pela reação stalinista, todos os males da economia burocrática (a burocracia demagógica e mesquinha tem, em toda parte, os mesmos traços! Na Argentina, a burocracia peronista promove o consumo de álcool por parte dos trabalhadores e trabalhadoras durante as mobilizações, transformando-as numa espécie de festa alienada, e não num momento de emancipação).

Para Rakovsky, o problema fundamental que a Oposição não havia abordado nas “Contra-Teses” dizia respeito ao papel da classe revolucionária que tomou o poder. “Hoje ninguém”, afirmava ele, “pode ignorar as consequências terríveis da indiferença política da classe operária”.

E acrescentava algo que já assinalamos em nosso volume anterior: que o problema era mais difícil porque, na prática, tratava-se de uma questão nova: “Nunca antes os marxistas haviam enfrentado a questão do retrocesso e da decadência da classe operária depois da tomada do poder.” Fagan acrescenta que “Trotsky havia usado o conceito de Termidor em relação à ala direita do partido, os defensores da propriedade privada”, mas que “Rakovsky também havia estudado a Revolução Francesa [da qual era um dos maiores especialistas entre os bolcheviques] e extraía dela lições de certa forma diferentes. O conceito de Termidor era ‘enganoso’” (Fagan, ibid.). “Molotov pode, com o coração alegre, estabelecer um sinal de igualdade entre a ditadura do proletariado e nosso Estado, com suas instituições burocráticas e, pior ainda, com os brutos de Smolensk, os vigaristas de Tashkent e os aventureiros de Arniemovsk. Ao fazer isso, não faz mais do que desacreditar a ditadura, sem desarmar o legítimo descontentamento dos operários.” (Os perigos profissionais do poder)

A sequência dos acontecimentos continuou em julho de 1929 com a capitulação de Preobrajensky, Radek e Smilga: “rompemos ideológica e organizativamente com Trotsky”. Rakovsky foi deportado repetidas vezes durante esses anos (Astracã, Saratov, Barnaul), e em fevereiro de 1930 a GPU confiscou e aparentemente destruiu todos os seus textos escritos no exílio — razão pela qual até hoje não há notícias dos preciosos textos desse período, considerado o mais brilhante de sua trajetória intelectual, segundo o próprio Trotsky.

Em suma, parte da abordagem unilateral da burocratização da URSS foi perder de vista o papel da democracia socialista no processo de transição. Habitualmente, ela é tratada como um mero problema de “regime político” (uma “verruga no rosto”): mais ou menos democracia socialista não afetaria o caráter operário do Estado proletário. Essa operação de separar esquematicamente regime e Estado, política e economia, é realizada ao se colocar a democracia socialista como uma simples “relação política”, pertencente à superestrutura — e não como o que realmente é: uma parte integrante e íntima da estrutura econômico-social da sociedade de transição. O politólogo marxista francês Antoine Artous aponta isso com todas as letras, ao refletir sobre a evolução do pensamento de Trotsky a esse respeito. Segundo ele, a reflexão de Trotsky sobre o lugar da democracia soviética na URSS levou-o a “precisar sua função socioeconômica” — uma temática, acrescenta, “pouco presente na Rússia dos anos 1920” (Artous, 2016: p. 362).

2 – Economia e política na transição

Artous cita Trotsky: “Se existisse um cérebro universal, como o descrito pela fantasia intelectual de Laplace — um cérebro que registrasse ao mesmo tempo todos os processos da natureza e da sociedade, que medisse a dinâmica de seu movimento, que previsse os resultados de sua ação — um cérebro assim poderia construir a priori um plano econômico definitivo e sem nenhum defeito, começando pelo cálculo dos hectares de forragem e terminando pelos botões de colete. De fato, a burocracia frequentemente se imagina como sendo ela mesma dotada de um cérebro semelhante; por isso, se livra tão facilmente do controle do mercado e da democracia soviética. Na realidade, a burocracia se engana profundamente na avaliação de seus próprios recursos intelectuais.” (A economia soviética em perigo, 1932, citado por Artous, 2016: pp. 362–363) [Artous comenta:] A função socioeconômica atribuída dessa forma à democracia soviética […] introduz elementos de ruptura importantes em relação a uma tradição economicista então amplamente dominante. [2]

A esse respeito — e como analogia histórica sobre os variados funcionamentos do materialismo histórico em diferentes sociedades — podemos lembrar o clássico artigo de Marx “A dominação britânica na Índia” (publicado no Daily Tribune, em 25/06/1853). A riqueza desse texto, ainda que marcado por certas unilateralidades teleológicas, reside em destacar com clareza como, nas sociedades “asiáticas”, o mecanismo estatal fazia parte das próprias relações de produção: “No Oriente, o baixo nível de civilização e a vastidão dos territórios impediram o surgimento de associações voluntárias e impuseram a intervenção do poder centralizado do governo. Daí o fato de que todos os governos asiáticos tivessem que desempenhar essa função econômica: a organização das obras públicas. […] Ali, a colheita depende tanto de um bom governo quanto, na Europa, do bom tempo.” (Marx citado por Maurice Godelier em Sobre o modo de produção asiático, 1969: pp. 81–82)

Trotsky destacava que, em sociedades com economias planificadas como a URSS, a importância do governo se multiplicava muitas vezes em relação ao capitalismo clássico de “livre mercado”. E Engels se expressava no mesmo sentido ao tratar do caso do Oriente: “(…) a ausência de propriedade [privada] da terra é certamente a chave para a compreensão de todo o Oriente. Aqui reside sua história política e religiosa (…) A irrigação artificial é aqui a condição primeira da agricultura, e isso é tarefa das comunas, das províncias ou do governo central (…) a livre concorrência se desacredita aqui por completo.” (Carta de Engels a Marx, Manchester, 6/06/1853, 1969: p. 74)

A modo de digressão, vale lembrar que Marx concluía seu clássico artigo de 1853 com um acento “deutscheriano” (e eurocêntrico) avant la lettre: “A intromissão inglesa (…) dissolveu essas pequenas comunidades semibárbaras e semicivilizadas ao fazer saltar sua base econômica, produzindo assim a maior e, para dizer a verdade, a única revolução social que jamais tenha visto a Ásia [itálicos de Marx].” E acrescenta: “Por mais lamentável que isso seja do ponto de vista humano (…) não devemos esquecer (…) que essas comunidades idílicas e idealizadas (…) restringiram o intelecto humano aos limites mais estreitos (…) privando-o de toda grandeza e de toda iniciativa histórica (…) submetiam o homem às circunstâncias externas, em vez de torná-lo soberano delas, transformando seu estado social — que se desenvolvia por si só — em um destino natural e imutável, criando assim um culto grosseiro à natureza, cuja degradação salta aos olhos no fato de que o homem, soberano da natureza, ajoelhasse diante do macaco Hanuman [rei-macaco mítico divinizado por Vishnu] e da vaca Sabbala [vaca sagrada do hinduísmo, símbolo de fertilidade e riqueza].” (Marx, ibid.) [3]

É evidente que aquilo que Marx afirma sobre a emancipação humana e a individuação é revolucionário, mas isso não podia ser realizado — por assim dizer — “de fora” da sociedade indiana, e muito menos com base em uma burda teleologia histórica, como se demonstrou — apesar de todas as suas contradições — com a independência da Índia em 1947, fruto da luta de seu próprio povo.[4]

Um século depois, Isaac Deutscher basearia sua avaliação do papel histórico do stalinismo nessa mesma teleologia (com a diferença de que Marx acabaria corrigindo-a, e Deutscher, não!). Marx escrevera: “É verdade que, ao realizar uma revolução social no Hindustão, a Inglaterra agia movida pelos interesses mais mesquinhos, e demonstrava verdadeira estupidez na maneira de impor seus interesses. Mas isso não é o mais importante. A questão é saber se a humanidade pode cumprir sua missão sem uma revolução profunda no estado social da Ásia. Se não pode, então, apesar de todos os seus crimes, a Inglaterra foi o instrumento inconsciente da história ao realizar tal revolução.” (Marx, ibid.)

De todo modo, a história não tem nenhum “instrumento inconsciente”. (“A História com H maiúsculo não faz nada”, afirmará Marx, acrescentando que quem “vive e sente é o próprio ser humano”: o motor da história é a luta dos seres humanos contra a natureza e entre si — não existe outro.) [5]

Por outro lado, a Ásia de fato conseguiu, de certo modo, realizar sua “revolução social” de forma autônoma, como demonstra a ascensão da China a potência mundial neste século, bem como a transferência do centro da economia capitalista para a região Ásia-Pacífico — ainda que essa “revolução social” não tenha sido uma revolução socialista, mas sim, com todas as voltas e paradoxos da história, uma revolução capitalista.

Retomando nosso argumento, e para concluir essa ideia de como a política está imbricada na sociedade de transição socialista (assim como esteve nos modos de produção pré-capitalistas), podemos citar o economista polonês Karl Polanyi, cuja obra, embora de inspiração weberiana, possui grande profundidade e nos serve como antídoto contra os esquematismos do marxismo vulgar — sobretudo para especificar o funcionamento do materialismo histórico na transição socialista: “Como reconhecem unanimemente os especialistas no tema, todas as tentativas de instaurar uma economia naturalista [naturalizar as categorias da análise social] fracassaram. A razão é muito simples. Nenhum conceito meramente naturalista pode competir de modo algum com a análise econômica em um sistema de mercado. E dado que a economia em geral passou a ser equiparada ao sistema de mercado, as tentativas ingênuas de substituir a análise econômica por um esquema naturalista caíram em descrédito.” (O lugar das economias nas sociedades, 1957, Polanyi, 2012: p. 85) E finaliza com a seguinte sentença: “(…) o estudo dos fenômenos de mercado (…) sua pertinência para qualquer sistema que não seja o de mercado — por exemplo, uma economia planificada — é insignificante.” (Polanyi, ibid.) [6]

Polanyi conclui sua reflexão nesse importante artigo afirmando que é preciso se libertar da ideia de que a economia é um “campo de experiência” no qual os seres humanos sempre foram conscientes (o conceito de campo de experiência nos é simpático). Os fatos econômicos, afirma Polanyi, estavam originalmente enraizados em situações que não eram, em si mesmas, de caráter econômico — nem os fins, nem os meios eram principalmente materiais. A cristalização do conceito de economia foi uma questão de tempo e de história. Mas nem o tempo, nem a história nos forneceram as ferramentas conceituais necessárias para penetrar no labirinto das relações sociais nas quais a economia estava enredada.

Tudo isso é extremamente verdadeiro, exceto pela afirmação unilateral de que “as situações não eram, em si mesmas, de caráter econômico, nem os fins, nem os meios principalmente materiais”, o que configura uma afirmação idealista (sobretudo a segunda parte da sentença). Pois, se a relação primária da humanidade é sua relação com a natureza para poder subsistir e se reproduzir, é evidente que, ao menos uma parte de suas relações (não importa o quanto estejam hibridizadas com determinações políticas e religiosas), não pode deixar de ser material — isto é, econômica. E, vice-versa, isso é fundamental para compreender a transição socialista, onde essas relações econômicas, essas relações materiais, estão inevitavelmente entrelaçadas com relações políticas: o planejamento democrático e a democracia socialista são partes íntimas do mecanismo da economia. A “economia transitória” não é “pura” como um nível “isolado”, tal como se apresenta no capitalismo — conforme tentamos demonstrar em nosso volume I, e retomamos agora, no nível específico da economia de transição, neste volume II.

E é paradoxal que tenha sido Bukharin — e não Preobrazhensky — quem compreendeu isso, ainda que de forma oportunista, no debate econômico dos anos 1920: “Separar totalmente a economia da política, ignorar a política, significa não compreender o problema em sua totalidade, não captar seu significado histórico, perder de vista o essencial, o que não pode ser deixado de lado.” (Bukharin, 1973: p. 37) Na parte 2 desta Introdução veremos que tanto Trotsky quanto Gramsci afirmavam o mesmo, mas desde uma perspectiva de esquerda.

3 – A armadilha economicista

Na década de 1920, processou-se na URSS um debate apaixonante acerca dos caminhos da transição socialista. Em meio a circunstâncias políticas e econômicas mutáveis — e do isolamento em que ficou a República Soviética após o fracasso da Revolução Alemã de 1923 — emergiu uma luta política encarniçada sobre como orientar o processo de transição no contexto do cerco material e político em que a URSS se encontrava.

Esse debate ia além da economia e dizia respeito à estratégia global da construção do socialismo na URSS e à revolução internacional. A burocracia emergente, apoiando-se nas derrotas pelas quais ela própria era responsável, começou a promover a formulação do “socialismo em um só país” (Stálin, Os fundamentos do leninismo, 1924), em oposição à perspectiva internacionalista sustentada por Trotsky e pela Oposição de Esquerda (Stalin, o grande organizador de derrotas. A III Internacional depois de Lênin, 1927).

A perspectiva internacionalista e centrada na luta de classes (Trotsky) confrontava-se com a perspectiva nacionalista, centrada nas relações entre Estados e na construção do socialismo num só país (Stálin). No campo econômico, a orientação nacionalista foi inicialmente defendida por Zinoviev, Kamenev e Stálin (entre 1923 e 1924) e, a partir de 1925, por Stálin e sobretudo Bukharin, que impulsionaram uma versão oportunista da NEP: o enriquecimento camponês e a “industrialização a passo de tartaruga”, retardando a necessária industrialização do país. Bukharin criticava Trotsky por, segundo ele, “ver apenas a ruína se a revolução mundial não chegasse imediatamente” (Bukharin, 1973: p. 7–8) — uma asserção materialista que tentava rebater com base em citações de Lênin.

As crescentes divergências de Zinoviev e Kamenev com Stálin levaram à conformação da Oposição Conjunta, junto com Trotsky e outros dirigentes próximos a ele, entre 1926 e 1927. A Oposição Conjunta assumiu os postulados da original Oposição de Esquerda, expressos na “Plataforma dos 46”, apresentada ao Comitê Central do Partido Bolchevique no final de 1923, que constituiu o primeiro manifesto opositor anti-stalinista de envergadura na história do partido (três importantes oposições haviam existido anteriormente no Partido Bolchevique: os “comunistas de esquerda”, contrários ao acordo de Brest-Litovsk em 1918, encabeçada por Bukharin; o grupo Centralismo-Democrático de Sapronov e Smirnov, que sobreviveu até os grandes expurgos de 1936–1938; e a Oposição Operária, de Kollontai e Schiapolnikov — além de outros grupos menores).[7]

Essa plataforma insistia em dois problemas centrais que ameaçavam a vida do Estado soviético: a) a tendência à liquidação da democracia soviética e da democracia interna no partido; b) os problemas do desenvolvimento econômico da economia em transição — problemática que foi elaborada, no plano teórico da Oposição, pelo eminente economista soviético Evgueni Preobrazhensky (embora não exclusivamente por ele). Em sua conhecida obra A Nova Economia (1926), ele defendia a necessidade inadiável do planejamento em uma economia estatizada: se os principais meios de produção são estatizados mas não se planeja, o que se constrói é apenas uma “economia caotizada”. Esse era um dos argumentos centrais da Oposição de Esquerda no plano econômico, junto à necessidade de que a acumulação se fortalecesse no setor statizado-industrial da economia — e não fosse desproporcionalmente direcionada à burguesia e pequena burguesia agrária e urbana (a NEP inevitavelmente lhes permitia alguma acumulação, mas isso não poderia ocorrer à custa da classe trabalhadora.)

No entanto, o ponto cego da abordagem de Preobrajensky começava quando ele elevava o planejamento à categoria de “lei econômica inexorável” (o giro à “esquerda” de Stálin teria sido produto de uma “lei inelutável da história”, afirmaria Preobrajensky — segundo Fagan), o que se transformou numa justificativa da planificação burocrática estalinista. O erro de Preobrajensky e de outros capituladores como Radek, Smilga (também economista soviético), etc., podia ser explicado em parte pelo caráter empírico da Plataforma da Oposição de 1927, mas não totalmente: nela estava claro que o giro econômico industrializador exigido deveria ser em benefício dos trabalhadores e trabalhadoras. Ou seja, exatamente o oposto do que ocorreu: quem pagou com sua carne e seu sangue pela industrialização da URSS foram operários e camponeses.

A abordagem de Preobrajensky continha outras falhas: uma visão excessivamente nacional do desenvolvimento econômico da URSS. É significativo que muitas das avaliações unilaterais do enfoque econômico de Preobrajensky tenham sido retomadas por economistas trotskistas como Ernest Mandel no pós-guerra. O marxista belga extrapolava a fragmentação do mercado mundial causada pela crise dos anos 1930 e acreditava ver leis completamente distintas entre a economia capitalista e a economia de transição (Tratado de economia marxista, 1962), o que obscurecia a combinação de reguladores político-econômicos que caracterizam a economia de transição, além de ofuscar a permanência de trocas de valor nela (trocas que o estalinismo conscientemente ocultava, apenas para depois naturalizar sua existência em Problemas econômicos do socialismo, Stálin, 1951).

A isso se somava uma abordagem sectária em relação ao campesinato: ele o colocava na posição de uma “colônia” do país, às custas da qual se deveria implementar uma política de “acumulação primitiva socialista” (termo que problematizaremos neste tomo II). Bukharin percebeu a oportunidade e atacou isso de maneira demagógica: “A indústria socialista recebe dos pequenos produtores uma mais-valia para o fundo de acumulação. Não há nenhuma dúvida quanto a isso. Assim se realiza uma transferência de valor das mãos de uma classe para as de outra, que é a dominante. Também quanto a isso não há dúvida. Mas, pode-se definir essa relação como uma relação de exploração, recorrendo a grosseiras analogias com a classe capitalista? (…) É possível definir com base nisso o proletariado como classe exploradora (o que necessariamente decorre da tese anterior)?” (Bukharin, 1973: 9)

É evidente que Preobrajensky não definia a classe trabalhadora como “uma nova classe exploradora”. No entanto, ao colocar as relações do proletariado com o campesinato como uma espécie de relação “colonial” — ainda que usasse o termo de maneira figurada — abria caminho para o oportunismo de Bukharin (voltaremos a isso no desenvolvimento desta seção do nosso tomo II).

A Oposição Conjunta se fraturou sob a pressão da derrota esmagadora no XV Congresso do Partido Bolchevique (2 a 19 de dezembro de 1927), manipulado burocraticamente. No dia 10 de dezembro, Stálin conseguiu que o Congresso votasse a expulsão do partido de Trotsky, Zinoviev, Kamenev e seus companheiros. Rakovsky e Kamenev, únicos representantes da Oposição Conjunta no Congressonem sequer puderam concluir suas intervenções, em meio a vaias e todo tipo de provocações dos delegados presentes (entre eles, o idiota do Bukharin!).

Kamenev e Zinoviev se apressaram em capitular, com a desculpa de permanecer dentro do partido: “às vezes é preciso ter coragem para isso”… Trotsky riu na cara deles com a implacabilidade que o caracterizava!

Como parêntese, cabe destacar que capitular é sempre covardiaEm um militante revolucionário, significa renunciar às próprias ideias — isto é, a “morte política” (um militante que renuncia às suas ideias perde todo seu valor). Ernst Bloch nos deixou um belo exemplo em sentido contrário na história da filosofia: “O que distingue Giordano Bruno de todos os outros filósofos de seu tempo é o fato de que ele permaneceu fiel à sua verdade mesmo diante da morte: primeiro entre os mártires cristãos, ele é, depois de Sócrates, o mais evidente de todos os mártires da verdade científica.” (Bloch, 2007: 31)

Se o XV Congresso havia se “antecipado” a votar um inconsequente e tímido Primeiro Plano Quinquenal, a ironia é quelogo após o Congresso, uma aguda crise de abastecimento agrícola levou à ruptura da aliança Stálin–Bukharin (1928/29).

Primeiro de forma hesitante, depois de maneira decididaStálin assumiu um giro político-administrativo brutal, impondo a coletivização agrária forçada, a industrialização acelerada, os métodos stajanovistas de superexploração da classe operária, formas de trabalho forçado, o sistema de campos de trabalho forçado (Gulag), sem esquecer as Grandes Purgas. Esse giro se estendeu por toda a década de 1930modificando completamente — e de forma duradoura — a URSS. Nesse processo, o Estado operário com deformações burocráticas transformou-se num Estado burocrático com restos da revolução: “Após o XV Congresso, a crise tomou novas formas. Na etapa atual, a crise assumiu a forma de uma crise muito profunda nas relações fundamentais entre o proletariado e o campesinato, tal como foram estabelecidas com a adoção da NEP — ou seja, uma crise da NEP. Essa crise nas relações entre o proletariado e o campesinato reflete a crise entre a indústria nacionalizada e a economia camponesa individual, devido ao atraso da primeira (…) por isso foi necessário interromper prematuramente a NEP e recorrer a métodos de coerção extraeconômica.”
(G. Iakovin, E. Solntsev, G. Stopalov, A crise da revolução, as perspectivas de luta e as tarefas da Oposição, junho de 1930, em Les Cahiers de Verkhnéouralsk, 2021: 39)

Este texto dos jovens oposicionistas no isolador tem sua agudeza, ao sublinhar que a Oposição de Esquerda sempre rejeitou os métodos de violência puramente administrativa sobre o campesinato; que nunca considerou que a versão oportunista da NEP liberal levada adiante pelo bloco direitista entre 1923 e 1927 (primeiro Zinoviev, Kamenev e Stálin; depois Stálin e Bukharin), com um papel mínimo do Estado e das organizações proletárias na regulação dos processos econômicos e da luta de classes, fosse “a única possível” (idem).

O texto acrescenta que, sob a pressão das circunstâncias, o que a burocracia estava fazendo era travar uma luta do aparato contra o kulak [na realidade, contra todo o campesinato!][8] e contra a economia privada — uma “aventura burocrática” que desconfiava das massas e que, “sob consignas de ordem ultraesquerdista de coletivização total do campesinato”, hipotecava “os interesses imediatos e históricos do proletariado”. Percebe-se que os jovens bolcheviques-leninistas tinham plena consciência da complexidade dessas relações de classe em países atrasados como a URSS dos anos 1920, com um campesinato imenso e diversificado. O texto também formulava uma crítica à desnaturalização das tarefas da transição por meio “destes meios, ou seja, métodos administrativos e não de classe, conferindo ao conjunto um caráter de frenesi burocrático” (idem, pp. 44, 46).

O texto acrescenta: “(…) devemos desmascarar os métodos do aparato e os métodos «acima das classes» dos centristas” (idem, p. 50). Ou seja, o estabelecimento de uma economia “quase puramente burocrática”, tal como Trotsky se referia em artigos contemporâneos. E depois repete-se a mesma ideia: que a política stalinista se colocava “acima das classes”, o que significa — ao nosso ver — que estava se construindo outro tipo de Estado: “A situação jurídica dos operários está caracterizada pela supressão de uma série de conquistas de Outubro e pelo afastamento do proletariado da direção imediata do Estado e do aparato econômico” (idem, p. 55).

“A questão do ritmo de industrialização foi transformada numa questão de pura vontade, a qual se realiza com a ajuda do knout [chicote] administrativo (…) Avançando pela linha de menor resistência (…) o centrismo coloca todo o peso da industrialização sobre os ombros da classe operária (…) O resultado de tudo isso é o agravamento sistemático da situação material e jurídica da classe operária” (idem, pp. 54–55), — exatamente o oposto do que propunham as teses da Oposição no XV Congresso.

Não deixa de ser teoricamente interessante que se fale da “situação material e jurídica” da classe operária. O agravamento material é evidente e conhecido. Mas ao falar da “situação jurídica” dos trabalhadores e trabalhadoras, o texto parece afirmar duas coisas: a) Uma explícita, vinculada aos decretos com os quais os stalinistas puniram brutalmente todo tipo de “delito” … como o roubo de grãos por fome, e proibiram a livre circulação de trabalhadores e camponeses dentro da Rússia (decretos do tipo de um Estado totalitário); b) Simultaneamente, de forma mais sutil, à luz de afirmações de Trotsky sobre o formalismo que assume, em tais circunstâncias, a propriedade estatizada, há uma crítica velada ao caráter operário da URSS: “As formas às quais se reduz (…) a direção única significam a liquidação de fato da direção tripartite das fábricas, ou pior ainda, a transformação dos organismos de base do partido e dos sindicatos em apêndices desprovidos de direitos dos órgãos econômicos”. “A classe operária está desorganizada e privada de qualquer meio legal de influenciar a política (…) Vive-se um processo de afastamento da classe operária do poder (…) de crescimento do papel autônomo da burocracia”. “Mais do que nunca, ‘o regime do aparato é o pior de todos os perigos’. A luta contra esse regime do aparato, pela democracia proletária, [se coloca como a tarefa mais importante]” (idem, pp. 55, 60 e 66).

Bibliografia

AA.VV., Les cahiers de Verkhnéuralsk. Écrits de militants trotskystes soviétiques 1930/33. Les bons caractères, Collection Classiques. Tradução, apresentação e notas Pierre Laffite – Pierre Mattei – Léne Razina, Paris, 2021.

“Counter-Theses of the Opposition on the Five Year’s Plan of National Economy”, International Press Correspondence, Vol. 7, Nº 70, 12 de dezembro de 1927.

Antoine Artous, Marx, o Estado e a política, Sylone, Barcelona, 2016.

Ernst Bloch, A filosofia do Renascimento, Payot, Paris, 2007.

Nicolai Bujarin, Sobre a acumulação socialista, Editorial Materiales Sociales, texto original de Marcel Rivière, Paris, 1931; tradução Samuel Schafran e Lucio Morán, Buenos Aires, julho 1973.

Gus Fagan, “Biographical introduction to Christian Rakovsky”, 1980, MIA (Marxist Internet Archive).

Maurice Godelier, Sobre o modo de produção asiático, Ediciones Martínez Roca, Barcelona, 1969.

Karl Marx, Cartas a Kugelmann, Editorial Avanzar, Buenos Aires, 1969.

Karl Polanyi, Textos escogidos, Universidad Nacional de General Sarmiento, CLACSO, Argentina, 2012.

Christian Rakovsky, “Los peligros profesionales del poder”, Marxist Internet Archive.

H. Ticktin, “Trotsky’s political economic analysis of the URSS: 1929-1940”, Google.

Notas

[1] Esta certeira afirmação de Rakovsky mostra como, em última análise, a determinação na transição é política e não econômica: “Entre nós trata-se de um Estado operário. Ninguém pode ignorar os terríveis danos causados pela indiferença política na classe operária”. [2] A esse respeito, podemos ver um desenvolvimento crítico sobre as categorias do materialismo histórico na transição em nosso Materialismo histórico y transición socialista, parte 1 (izquierda web, 12/04/25). H.H. Ticktin, em “Trotsky’s political  economic analysis of de URSS: 1929-1940”, afirma que Trotsky não teria conseguido sistematizar os mecanismos teóricos da economia da transição. Contudo, seu texto de 1932, O fracasso do primeiro plano quinquenal, é uma refutação direta a essa assertiva. A matriz teórica do segundo tomo desta obra se baseia amplamente nas intuições do grande revolucionário russo sobre os reguladores da economia de transição, sistematizados sumariamente naquele texto e em outros escritos da época: “Stalin como teórico” (15/07/1930), “Algumas observações sobre o trabalho de Frank acerca da coletivização” (9/12/1930), “A degeneração da teoria e a teoria da degeneração” (29/04/1933), etc. (recopilado por Marcelo Yunes). [3] Em nosso Engels antropólogo tratamos da mesma problemática (ver subtítulo: “A conquista da individualidade livre”). [4] Não estudamos a fundo este processo, mas recordemos que durante décadas a Índia foi o centro do movimento dos não alinhados, nem com os EUA nem com a URSS. [5] “Qual é a lei de evolução do modo de produção asiático, se ele constitui um progresso originário das forças produtivas? Para nós, sua lei de evolução é, como para qualquer outra formação social, a lei do desenvolvimento de sua contradição interna. A contradição interna do modo de produção é a unidade de estruturas comunais e estruturas de classe. O modo de produção asiático evoluiria, através do desenvolvimento dessa contradição, para formas de sociedades de classes nas quais as relações comunais perderiam cada vez mais sua vigência em consequência do desenvolvimento da propriedade privada” (Godelier, 1969: 51). Acrescenta citando Engels que essa contradição era a que Marx colocava em primeiro lugar para compreender a natureza da “civilização”: “Sendo a base da civilização a exploração de uma classe pela outra, seu desenvolvimento opera-se numa contradição constante” (ídem, 56). [6] Ao nosso ver, o papel do mercado nas economias de transição não é insignificante, mas entende-se que é necessário especificar a análise em cada caso histórico concreto. [7] A primeira oposição esquerdista naturalizava o comunismo de guerra como um passo direto ao socialismo e, de um ponto de vista pequeno-burguês dispersante, opunha-se à formulação de Lenin que defendia a centralização da organização do nascente Estado soviético sob a formulação da instauração de uma espécie de “capitalismo de Estado”, que não era mais que uma forma de centralização estatal das atividades econômicas (“Acerca do infantilismo ‘esquerdista’ e do espírito pequeno-burguês”, 1918). Em 1919 surge o grupo Centralismo Democrático de Sapronov e Smirnov, preocupado com a decadência da democracia nos soviets e no próprio partido, e em 1920 e 1921 foi criada a oposição sindicalista chamada Oposição Operária, de Kollontai e Schiapolnikov, que durou pouco tempo. [8] A historiografia da ex-URSS já demonstrou há muito que a luta contra o kulak foi um mero espantalho para atacar todo o campesinato. [9] Gus Fagan via Deutscher aponta algo que temos a mesma percepção: que Rakovsky tinha uma mente clara e penetrante e talvez maior capacidade para o pensamento filosófico que Trotsky. Deutscher, mesmo em seu objetivismo, falava de um “distanciamento filosófico” das questões do dia a dia que caracterizava Rakovsky, provavelmente porque muitas de suas formulações parecem ancoradas diretamente em nossos clássicos: Marx e Engels.

Tradução Martin Camacho de Los reguladores de la economía de la transición, parte 1

Ilustração: Construcción de la fuerza espacial (1921), Liubov Popova.

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